sexta-feira, 11 de maio de 2007

Suzane Louise

Ultimamente tenho tido medo de dizer o que penso sobre a tal Von Richthofen. Olhos se arregalam quando digo que tenho pena – muita pena – da tal garota. A verdade é que, na adolescencia, época em que todos estamos mais propensos à estupidez, Von Richthofen cometeu um ato imperdoável: o Parricídio. Mentes doutoradas preenchem colunas de revista com protestos e tentativas de responder à inevitável pergunta: como deve funcionar a mente da criminosa? O que, afinal de contas, deu errado na criação da ré confessa? Em quê – e essa é a pergunta que mais aflige todos os pais da classe média-alta brasileira – Marísia e Manfred erraram?

Tirar a vida de outro ser humano é um ato que transcende todas as alternativas existentes para a resolução de um conflito. Em vulgas palavras, é apelar. Para matar os pais, então, é necessária a existêcia de um cenário psíquico bastante específico, criado a partir das relações existentes entre pais e filho. O assassinato dos pais de Suzane, visto sob esta ótica, foi apenas a manifestação máxima, chocante sintoma de uma doença relacional existentre na família Von Richthofen.

A mãe era psiquiatra, profunda conhecedora do escuro labirito em que pode se transformar a mente humana. Muitos perguntam: como Marísia pôde não perceber a estranheza da filha, bem debaixo de seu nariz? Já li por aí que era uma pessoa “estranha”, que na infância gargalhava sempre que via a mãe, professora, dar com a régua na mão dos alunos desobedientes. Se Marísia era sádica, quem sai aos seus não degenera.

O pai, Manfred, era um engenheiro que gostava de dizer aos quatro ventos que era descendente do Barão Von Richthofen, mais conhecido como Barão Vermelho, famoso expoente da aeronáutica alemã que combateu na Primeira Guerra Mundial. Só que era tudo mentira. Na época do crime, uns jornalistas foram atrás dessa história e o porta-voz dos Barões Vermelhos disse que Manfred não passava de um genérico. O que dizer da auto-estima e aceitação de si mesmo, e das próprias origens, deste senhor? E o que poderia ser dito sobre a forma com que transmitiu estes valores à seus filhos?

E de repente temos nossa Baroneza Von Richthofen. Uma menina que, segundo a família de Marísia, era grudada na mãe, até que o Sapo Daniel Cravinhos apareceu e estragou tudo. No começo os pais não deram importância ao namoro que, acreditavam, acabaria no exato momento em que Suzane se desse conta de que, Baroneza que era, merecia coisa melhor. A verdade é que a vida de Suzane, que era obrigada a fazer jardinagem por um hora, todos os dias, sempre que viajava para o sítio da família em São Roque, devia ser um saco. E, talvez pela primeira vez na vida, ela sentiu uns bons frios no estômago, descobriu o sexo ao lado de um menino meio largado de família humilde. A ironia é que, talvez, tenha sido no seio desta família humilde que Suzane pôde sentir algum calor humano, que era claramente compartilhado com o irmão mais novo Andreas. Quem não se lembra da cena do órfão soltando da mão de seu tio materno, na missa de sétimo dia dos pais, para correr na direção do pai dos assassinos de seus pais? Algo não se encaixa nisso tudo.

A verdade é que me parece muito mais provável que Manfred e Marísia tenham sido maus pais do que bons. Não é pagar colégio caro, escola de inglês, caratê, roupinhas de marca e TV a cabo que faz dos pais bons ou maus. Se não, pobre não era bom pai. O que me parece é que existia uma doença muito grave, em estado avançado, percorrendo as veias da família Von Richthofen, e que não foi diagnosticada a tempo.

Nada disso muda o fato de que Suzane errou. Errou, e o que fez é imperdoável. Nunca mais vai passar despercebida, nunca mais vai poder comprar um cigarro no RedeShop sem que a vendedora da padaria olhe para ela e pense, “criatura estranha que matou os pais”. Errou, e deve pagar por isso.

Mas mais do que pagar por isso, Suzane deve ser tratada. Cadeia não é o lugar dela, e sim uma Insituição Hospitalar Judicial. Porque é uma menina doente do ponto de vista mental, não daquelas que fica batendo com a cabeça na parede ou babando pelos cantos, mas uma doente cujo cérebro funciona de uma maneira errada, cuja mente não é similar as nossas mentes. Suzane nasceu sem um “chip”, e quando o meio à sua volta subiu de temperatura, assou-se o bolo. E nada nem ninguém pode prever quando é que um novo bolo será assado, pelo simples fato de que não se pode controlar o ocasional aumento de temperatura da vida, e os ingredientes psiquicos e emocionais de Suzane estão severamente estragados. Suzane precisa ser tratada pois, me desculpem, eu não precisaria ser psicóloga para afirmar que Suzane é doida de pedra.

A verdade é que, quando a sociedade coloca Suzane como a vilã ao invés de uma menina doente, algo se aquieta dentro do peito de centenas de famílias de classe média-alta, que intimamente se questionam se são pais suficientemente bons. Ao trancar Suzane no xilindró trancarão, no sótão emocional, o assustador monstro da insegurança de que talvez não estejam fazendo um trabalho bem-feito
com seus filhos. Quem garante que a dócil menina dormindo no berço ao lado não se transforme, em alguns anos, em uma assassina fria, que se certificará de que os pais estarão mesmo dormindo para que nada saia errado?

Eu tenho pena de Suzane Louise Von Richthofen. Tenho pena porque Suzane, ao lidar com sua doença familiar, escancarou a doença da sociedade bem na cara de todos, sem que ninguém pudesse fazer nada. A verdadeira causa de todos os sintomas de nossa doente sociedade, que mostra, através das drogas-espirros e da criminalidade-tosse, que algo não vai bem. Agora, Suzane virou mártir – “queimemos as bruxas na fogueira, apaguemos o incêndio, e que venham os antibióticos para que possamos varrer as bactérias de nossas vidas!” – e em relação a isso, ela nada poderá fazer. Vai ter que pagar pelo seu crime, e pelos crimes de todos nós, que fechamos os olhos para tudo o que acontece a uma distância superior a cinco centímetros de nossos umbigos. E que descanse em paz.
Novembro de 2006

5 comentários:

Anônimo disse...

ate que enfim achei alguem q assim como eu sente pena de suzane

Anônimo disse...

realmente acredito que seja doenca...e tenho pena dela ,sim.....o que ela fez da vida dela????nao sabia o que estava fazendo...nao havia necessidade desse ato horrivel....deveria ser tratada,sim.....se ficar presa como saira de la???? e a chance que a sociedade tem que dar a ela....a repercussao contrafoi da midia......instigando a todos a fazer o que fizeram na casa ..destruida....pra que isso???? e preciso saber perdoar.....de qualquer forma ela esta pagando....Deus a ilumine e faca comque la consiga um dia....viver ....

Anônimo disse...

tirar a vida dos pais e uma loucura....esses casos deveriam ser tratados especialmente por psiquiatras..psicologos...analisar a pessoa a fundo e checar o por que? dessa loucura...nao e um simples namorado que levou a isso...tem muitomais.....nao e droga....tem muito mais....o tratamento dela e outros deveria ser obrigacao da sociedade....se nao temos medicos e condicoes parea tratamentos normais de nosso povo..imagine para isso....outra coisa triste e esses reportes...midia....e de deixar qualquer louco.....mostrando de forma de convite para vc.participar desse odio....comocao do povo!!!! o mundo esta perdido....rezo quase todos os dias para suzane...uma memina que tinha de tudo....linda..educada..fina.meiga....porque????quem explica????? freud???tb.era louco.....

loco abuelo disse...

Doença é o caralho...

Isso no minimo tenque ser estrupada umas 1000 vezes na prisão, pra aprender na marra... UMA PESSOA DESSAS NÃO DEVE MORRER, É POUCO, QUE SOFRA MUITO AINDA!

Gabriela disse...

Nossa, seu texto é impecável! Você é realmente uma mulher inteligentíssima. Depois de tantos anos vendo notícias sensacionalistas e extremamente machistas sobre a Suzane cheguei a acreditar que todo mundo, á não ser os gays do twitter, que fizeram um fã clube oficial para a Suzane, achavam a Suzane um verdadeiro monstro apático e sociopata. E muitas vezes penso que as contas no twitter dedicadas á Suzane não passam de uma brincadeira de humor negro. Quis postar esse comentário porque o seu texto abriu a minha mente para muitos aspectos dos quais eu não estava considerando. A verdade é que sou estudante de cinema e estou escrevendo um roteiro baseado no caso de Suzane, mas não se confunda com o filme que irá sair próximo ano, com a Carla Diaz, o meu não sairá tão cedo mas em compensação não será sensacionalista como o da Carla, que recebeu o título: ''A Menina que Matou os Pais'' e ainda vai ser dirigido por um homem... Pois é. Eu espero que seu blog ainda esteja de pé ou que você chegue a ler esse comentário, pois adoraria ler mais sobre o que você pensa desse caso todo. E parabéns pelo texto!